ARREDONDAMENTO DE TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO PARA EFEITOS DE BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS PARA O SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL

Não é raro a discussão da possibilidade ou não de arredondamento de tempo de contribuição para efeitos previdenciários no âmbito do serviço público federal.

AGENTE DSOUSA

ARREDONDAMENTO DE TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO PARA EFEITOS DE BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS PARA O SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL

 

Por Francisco D´Sousa – Advogado e pós graduado em Direito Previdenciário, pela Legale Educacional.


Não é raro a discussão da possibilidade ou não de arredondamento de tempo de contribuição para efeitos previdenciários no âmbito do serviço público federal.

Até o advento do Estatuto atual do servidor público federal, Lei n. 8.112 de 11 de dezembro de 1.990, o servidor público federal era regido pela Lei n. 1.711 de 28 de outubro de 1.952, e referida norma instituía no art. 78, que a contagem do tempo de contribuição seria feita em dias, e o número de dias seria convertido em anos, considerando o ano como de trezentos e sessenta e cinco dias (§ 1º, art. 78).[1]

Feita a conversão, os dias restantes, até cento e oitenta e dois, não seriam computados, arredondando-se para um ano, quando excederem esse número, nos casos de cálculo para efeito de aposentadoria.

Com o advento da Lei n. 8.112/90, que dispõe sobre o regime jurídico dos servidores públicos civis da União, das autarquias e das fundações públicas federais, tal regra, referente ao arredondamento foi mantida no art. Parágrafo único do 101 da Lei n. 8.112/90, nos mesmos moldes previstos anteriormente.

Entretanto, referido dispositivo fora revogado pela Lei n. 9.527 de 10 de dezembro de 1.987[2].

Antes, porém, o Supremo Tribunal Federal já havia declarado a inconstitucionalidade do parágrafo único do art. 101, da Lei n. 8.112/90, nos autos da ADI 609-6, do Distrito Federal, cuja ação fora provocada pelo Procurador Geral da República, quando fora firmado a seguinte tese:

EMENTA: AÇÃO DIRERA DE INCONSTITUCIONALIDADE. TEMPO DE SERVIÇO PÚBLICO, PARÁGRAFO ÚNICO DO ARTIDO 101 DA Lei 8.112/90. ARREDONDAMENTO PARA EFEITO DE APOSENTADORIA. IMPOSSIBILIDADE. TEMPO FICTO SEM JUSTIFICAÇÃO. 1.Arredondamento, para um ano do período superior a 182 (cento e oitenta e dois) dias, para efeito de aposentadoria. Incompatibilidade do dispositivo legal com a regra prevista no artigo 40, III a da Carta da República. 2. Se a Constituição Federal estabelece tempo mínimo para a aposentadoria, não é facultado à lei ordinária reduzi-lo. 3. Hipótese que não se assemelha aos casos existentes de tempo ficto por constituir-se ficção contábil, não havendo motivo algum que a justifique. Ação direta de inconstitucionalidade julgada procedente.

A matéria não só se aplica aos servidores públicos federais, mas também aos trabalhadores da iniciativa privada. Vejamos o entendimento do STJ:

RECURSO ESPECIAL Nº 1993993 - SP (2022/0087874-6) DECISÃO Trata-se de Recurso Especial, interposto pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL, em 08/02/2021, contra acórdão do TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO, assim ementado: "DIREITO PREVIDENCIÁRIO. RECONHECIMENTO DE LABOR RURAL. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS. - Com o advento da Emenda Constitucional nº 20/98, a aposentadoria por tempo de serviço foi convertida em aposentadoria por tempo de contribuição, tendo sido excluída do ordenamento jurídico a aposentadoria proporcional, passando a estabelecer o artigo 201 da Constituição Federal o direito à aposentadoria no regime geral de previdência social, nos termos da lei, ao completar 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem e 30 (trinta) anos de contribuição, se mulher. - Entretanto, o art. 3º da referida Emenda garantiu o direito adquirido à concessão da aposentadoria por tempo de serviço a todos aqueles que até a data da sua publicação, em 16 de dezembro de 1998, tivessem cumprido todos os requisitos legais, com base nos critérios da legislação então vigente. - Ao segurado inscrito perante o Regime Geral de Previdência Social anteriormente à promulgação da Emenda Constitucional nº 20/98, mas que, nessa data (16 de dezembro de 1998), ainda não tivesse preenchido os requisitos necessários à sua aposentação, mesmo na forma proporcional, aplicam-se as regras de transição estabelecidas pelo art. 9º da referida normação constitucional. - Foram contempladas, portanto, três hipóteses distintas à concessão da benesse: segurados que cumpriram os requisitos necessários à concessão do benefício até a data da publicação da EC 20/98 (16/12/1998); segurados que, embora filiados, não preencheram os requisitos até o mesmo prazo; e, por fim, segurados filiados após a vigência daquelas novas disposições legais. - No caso dos autos, restou parcialmente demonstrado o exercício do labor rural pelo autor. - O somatório do tempo de serviço, valendo-se do critério de arredondamento, autoriza a concessão do benefício, a partir do requerimento administrativo. - Os honorários advocatícios deverão ser fixados na liquidação do julgado, nos termos do inciso II,do § 4º, c.c. § 11, do artigo 85, do CPC/2015. - Apelação do INSS parcialmente provida" (fls. 250/264e). O acórdão em questão foi objeto de Embargos de Declaração (fls. 282/288e), os quais restaram rejeitados, nos termos da seguinte ementa: "PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OBSCURIDADE, CONTRADIÇÃO E OMISSÃO NÃO CARACTERIZADAS. EFEITO INFRINGENTE. 1 - Inexistência de obscuridade, contradição ou omissão na decisão embargada. 2 - Inadmissibilidade de reexame da causa por meio de embargos de declaração para conformar o julgado ao entendimento da parte embargante. Caráter nitidamente infringente. 3 - Embargos de declaração rejeitados" (fls. 306/311e). Nas razões do Recurso Especial, interposto com base no art. 105, III, a, da Constituição Federal, a parte ora recorrente aponta violação: a) aos arts. 11, 489, II, e 1.022, I e II, do CPC/2015, sustentando a nulidade do acórdão regional; b) ao art. 53, da Lei 8.213/91, visto que "o acórdão recorrido concedeu a aposentadoria por tempo de contribuição integral para a parte autora arredondando para 35 anos de contribuição, quando a parte autora tinha apenas 34 anos, 11 meses e 21 dias, sem qualquer embasamento legal, apenas base nos princípios da razoabilidade e da maior proteção social, assim decidindo: 'Somando-se o período de atividade rural reconhecido ao tempo já reconhecido pelo INSS (25 anos,03 meses e 07 dias), a parte autora contava, em 14/10/2016 (data do requerimento administrativo), com 34 anos, 11 meses e 19 dias de tempo de serviço. Valendo-me do critério de arredondamento, bem como dos princípios da razoabilidade e da melhor proteção social, considero ultimados 35 anos de tempo de serviço, suficientes à concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, com renda mensal inicial correspondente a 100% (cem porcento) do salário de benefício, em valor a ser devidamente calculado pelo Instituto Previdenciário'. A condição para a aquisição do direito à aposentadoria por tempo de contribuição possui evidente caráter objetivo, o que afasta qualquer interpretação em desconformidade com a letra da lei. O mencionado 'arredondamento' constitui-se em ficção contábil, não havendo motivo algum que a justifique. A norma legal é taxativa e não comporta arredondamentos ou aproximação. Ademais, o tempo de contribuição previdenciária é calculado diariamente, onde inviável o arredondamento de frações de mês ou anos, ante a ausência de expressa autorização normativa. (...) Como se vê, a legislação previdenciária sempre exigiu a comprovação do efetivo exercício de atividade profissional por tempo mínimo de anos 35 anos para fins de concessão de aposentadoria por tempo de, contribuição integral salientando-se ser possível a concessão de aposentadoria proporcional caso adimplido o requisito etário. Logo, conclui-se que, independentemente da lei de regência da época em que foram prestados os serviços, a ausência do tempo mínimo no exercício de atividade, impossibilita a concessão do benefício, sob pena de afronta à legislação previdenciária e constitucional" (fls. 321/330e). Por fim, requer "seja conhecido e provido esse recurso especial, eis que demonstrados os requisitos da alínea 'a', do inciso III, do artigo 105, da Constituição Federal, para que seja anulado o acórdão recorrido, ou assim, não entendendo que SEJA JULGADO IMPROCEDENTE O PEDIDO DEAPOSENTADORIA EM RAZÃO DA IMPOSSIBILIDADE DE ARREDONDAMENTO DO TEMPO, visto que o v. aresto recorrido contraria legislação federal" (fl. 329e). Contrarrazões a fls. 341/344e. O Recurso Especial foi admitido pelo Tribunal de origem (fls. 345e). A irresignação não merece prosperar. De início, em relação à apontada violação aos arts. 11, 489, II, e 1.022, I e II, do CPC/2015, deve-se ressaltar que o acórdão recorrido, julgado sob a égide do CPC/2015, não incorreu em omissão, contradição ou obscuridade ou deficiência de fundamentação, uma vez que o voto condutor do julgado apreciou fundamentadamente, todas as questões necessárias à solução da controvérsia, dando-lhes, contudo, solução jurídica diversa da pretendida pela parte recorrente. Vale ressaltar, ainda, que não se pode confundir decisão contrária ao interesse da parte com ausência de fundamentação ou negativa de prestação jurisdicional. Nesse sentido: STJ, AgRg no AREsp 408.492/PR, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, DJe de 24/10/2013; STJ, AgRg no AREsp 406.332/MS, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, DJe de 14/11/2013; STJ, AgRg no REsp 1.360.762/SC, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe de 25/09/2013. Quanto à questão de fundo e à apontada ofensa ao art. 53, da Lei 8.213/91, verifica-se do exame atento das razões recursais, que a parte ora recorrente furtou-se de especificar quais incisos foram contrariados, a evidenciar a deficiência de fundamentação do apelo especial, atraindo, assim, a incidência da Súmula 284/STF, segundo a qual "é inadmissível o recurso extraordinário, quando a deficiência na sua fundamentação não permitir a exata compreensão da controvérsia". Destaque-se que esta Corte já decidiu que essa indicação genérica do artigo de lei que teria sido contrariado induz à compreensão de que a violação alegada é somente de seu caput, que, no caso, traz em seu texto uma mera introdução ao regramento legal contido nos incisos, nos parágrafos ou nas alíneas. Nesse sentido: "PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO INDENIZATÓRIA. DANOS MATERIAIS E MORAIS. ACIDENTE. BURACO EM VIA PÚBLICA. RAZÕES RECURSAIS DISSOCIADAS DA FUNDAMENTAÇÃO DO ACÓRDÃO. FUNDAMENTAÇÃO DEFICIENTE. INCIDÊNCIA DO ENUNCIADO N. 284 DA SÚMULA DO STF. ALEGAÇÕES DE VÍCIOS NO ACÓRDÃO. INEXISTENTES. (...) V - Quanto à segunda controvérsia, na espécie, incide o óbice da Súmula n. 284/STF, uma vez que não há a indicação clara e precisa do dispositivo de lei federal tido por violado, pois, nas razões do recurso especial, não se particularizou o parágrafo/inciso/alínea sobre o qual recairia a referida ofensa, incidindo, por conseguinte, o citado enunciado:"É inadmissível o recurso extraordinário, quando a deficiência na sua fundamentação não permitir a exata compreensão da controvérsia". VI - Nesse sentido, esta Corte Superior de Justiça já consignou que"o recurso especial não é um menu onde a parte recorrente coloca à disposição do julgador diversos dispositivos legais para que esse escolha, a seu juízo, qual deles tenha sofrido violação. Compete à parte recorrente indicar de forma clara e precisa qual o dispositivo legal (artigo, parágrafo, inciso, alínea) que entende ter sofrido violação, sob pena de, não o fazendo, ver negado seguimento ao seu apelo extremo em virtude da incidência, por analogia, da Súmula 284/STF"( AgRg no AREsp 583.401/RJ, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, DJe de 25/3/2015). VII - Confiram-se ainda os seguintes julgados: AgInt no AREsp n. 1.229.292/SP, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, DJe de 4/9/2018; AgInt no AgRg no AREsp n. 801.901/SP, relator Ministro Moura Ribeiro, Terceira Turma, DJe de 1º/12/2017; AgInt nos EDcl no AREsp n. 875.399/RS, relator Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, DJe de 1º/8/2017; AgRg no Ag n. 341.240/SP, relator Ministro Massami Uyeda, Quarta Turma, DJ de 6/8/2007, p. 493; e AgRg no REsp n. 695.304/RJ, relator Ministro Francisco Falcão, Primeira Turma, DJ de 5/9/2005, p. 263. VIII - Agravo interno improvido" (STJ, AgInt no AREsp n. 1.558.460/SP, relator Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA, DJe de 11/3/2020). Ante o exposto, com fundamento no art. 255, § 4º, I e II, do RISTJ, conheço parcialmente do Recurso Especial, e, nessa extensão, nego-lhe provimento. Em atenção ao disposto no art. 85, § 11, do CPC/2015 e no Enunciado Administrativo 7/STJ ("Somente nos recursos interpostos contra decisão publicada a partir de 18 de março de 2016 será possível o arbitramento de honorários sucumbenciais recursais, na forma do art. 85, § 11, do NCPC"), majoro os honorários advocatícios em 10% (dez por cento) sobre o valor já arbitrado, levando-se em consideração o trabalho adicional imposto ao advogado da parte recorrida, em virtude da interposição deste recurso, respeitados os limites estabelecidos nos §§ 2º e 3º do art. 85 do CPC/2015. I. Brasília, 31 de agosto de 2022. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES Relatora (STJ - REsp: 1993993 SP 2022/0087874-6, Relator: Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, Data de Publicação: DJ 02/09/2022)

Por fim, quão a apuração do tempo de serviço, será feita em dias, que serão convertidos em anos, considerado o ano como de trezentos e sessenta e cinco dias e, por amor ao debate, não se computa anos bissextos.

 

[1] https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/1950-1969/L1711.htm

[2] https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8112cons.htm

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